sexta-feira, 8 de agosto de 2025

Nos ombros de gigantes mágicos, Artigo de Carlos Haag na Revista de Pesquisa da FAPESP, edição especial maio/2012.

Nos ombros de gigantes mágicos

Processo de transformação da alquimia em química foi mais longo e suave do que se imagina

CARLOS HAAG | Edição Especial 50 Anos de FAPESP

      Foi preciso muita coragem para Einstein assumir, em plena idade moderna, que “a ciência sem a religião é coxa e a religião sem a ciência é cega”. Em especial, a primeira parte da citação ainda provoca calafrios em muitas mentes científicas que associam de forma ortodoxa ciência à ideia de progresso: assim, os antigos conheceram pior do que os medievais e estes pior que os modernos, totalmente libertos de qualquer “obscurantismo” religioso. “Em especial, há a visão de uma estreita passagem da alquimia para a química, entre meados dos anos 1600 e finais dos anos 1700, cujas marcas seriam a publicação de Químico cético, de Boyle, livro que teria iniciado a química moderna em 1661, e o ‘gran finale’ de Lavoisier em seu Tratado elementar de química, em 1789”, explica a professora Ana Alfonso-Goldfarb, do Centro Simão Mathias de Estudos em História da Ciência (Cesima), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
        
“Não se pode dissociar o desenvolvimento da ciência de aspectos religiosos, assim como o saber alquímico e tradição hermética não foram eliminados pela revolução científica, mas conviveram por longos séculos. Não se trata de rupturas, mas de permanências e transformações lentas de conhecimentos antigos”, analisa a pesquisadora que, ao lado da professora Márcia Ferraz, também do Cesima, trouxe à luz uma importante rede de discussões sobre os princípios da matéria, que se estendeu até, pelo menos, o século XVIII, no projeto temático Revelando os processos naturais através do laboratório: a busca por princípios materiais nos três reinos até a especialização das ciências no setecentos, apoiado pela FAPESP.  “Mentes notáveis de uma instituição como a Royal Society, apesar de realizarem procedimentos próximos aos da ciência moderna ainda viam no laboratório ‘iluminista’ o ‘olhar de Deus’”, observa Márcia Ferraz. Foi, aliás, mergulhando nos arquivos da sociedade britânica que as duas estão colocando cada vez mais em suspeição a crença de que a alquimia, baseada em mistérios, não resistiu à passagem para um universo racional e mecanicista, onde qualquer mistério era inadimissível.

        “As ideias alquímicas, sob outro nome, ainda intrigaram por muito tempo grandes figuras hoje associadas à ciência moderna. Essa é a beleza dessa história: não há uma razão única, mas várias ‘razões’ que souberam conviver até o século XIX”, analisa Ana. Isso será, aliás, o foco do desdobramento do temático num novo projeto, também apoiado pela FAPESP e iniciado agora, que alcançará o oitocentos, período em que, as pesquisas das professoras confirmaram, se dará o efetivo desmembramento das áreas do saber em direção a um sistema de organização moderno. “Ao mesmo tempo, e talvez não por acaso, a noção de princípio ou princípios materiais será superada de muitas formas, inclusive por meio de variações distantes como foram as novas concepções de princípios ativos”, afirma Márcia.
          Até então, duas vertentes dividiam o interesse dos estudiosos. Uma das perspectivas concebia a organização da matéria em “princípios reitores”: estes seriam exclusivos ao reino que constituíam e intransferíveis, mesmo no laboratório, a outros reinos da natureza. Um segundo grupo, preconizava a existência de um único princípio que circularia entre os três reinos (mineral, vegetal e animal), embora agindo de forma distinta em cada um deles. Crença que datava a tempos aristotélicos, essa ideia se fundamentava na observação de processos em que materiais de reinos distintos, ao interagirem, pareciam transferir suas características uns aos outros. Entre os adeptos dessa visão estavam estudiosos notáveis da primeira modernidade e suas reverberações continuaram a prevalecer século XVIII adentro.
      “Muitas das obras que criaram a ciência moderna estavam num limiar, captando, por um lado, essa lógica totalizante dos saberes de vozes do passado e, ao mesmo tempo, iniciando um contato com a nova cosmologia e as novas ideias”, diz Ana. Para as próprias pesquisadoras, no início, a descoberta de que homens como Boyle e Newton acreditavam na possibilidade da “pedra filosofal” provocou uma sensação incômoda. Mas, boas adeptas da razão, os achados documentais das pesquisadoras no acervo da Royal Society fizeram com que elas revissem suas crenças e passassem a enxergar os antigos modelos da nova ciência pelo prisma da época, e não com a visão anacrônica e “preconceituosa” dos nossos tempos.
          Afinal, como desmentir um documento oficial de uma instituição vetusta que acaba de completar 350 anos de história, em especial nos escritos de Henry Oldenburg, membro de uma rede europeia de sábios e secretário da recém-criada sociedade inglesa. “Para os estudiosos da Royal Society não havia nada mais a se descobrir em seus arquivos, em especial após a catalogação completa do acervo feita pelo casal Marie e Rupert Hall a partir dos anos 1960”, conta Ana. As brasileiras, porém, descobriram muito material nos “fundos fechados” do arquivo, e não foi pouca coisa. O achado mais “espetacular” foi a “receita” do alkahest, suposto “solvente universal” alquímico que poderia dissolver qualquer substância, reduzindo-a a seus componentes primários. Isso, nos papéis de homens “iluminados” pela razão como Oldenburg e Jonathan Goddard, lente da instituição. A descoberta só confirmava que os “papéis secretos” de Newton, aos poucos revelados desde os anos 1930, e sua relação com a alquimia, eram a ponta de umiceberg maior do que o desejável.

           “Havia uma segunda agenda na pauta dos novos cientistas e os documentos mostram, numa forma concisa e quase moderna, que em muitos experimentos havia concepções e processos ligados a velhos tratados e receituários. Basta ver as tentativas de refino de ouro com antimônio descritos por Goddard à Royal Society”, lembra Márcia. Antes de julgar, porém, é preciso conhecer a vinculação, na época, das ciências da matéria às ciências médicas, lugar preferencial desse hibridismo entre o antigo e o novo no campo de batalha dos laboratórios. “Os chamados ‘males da pedra’, a litíase renal, era uma das principais causas de morte até o século XIX. Nesse contexto, a alquimia se insinuou como tábua de salvação, já que sua suposta capacidade de ‘abrir’ os materiais mais resistentes, para extrair sua essência mais pura, poderia dissolver as pedras do organismo”, observa Ana.
O Projeto
Revelando os processos naturais através do laboratório: a busca por princípios materiais nos três reinos até a especialização das ciências no setecentos – nº 2005/56638-7(2006-2011)
Modalidade
Auxílio Pesquisa – Projeto Temático
Coordenadoras
Ana Maria Alfonso – Goldfarb
Márcia Ferraz Cesima – PUC- SP
Investimento
R$ 659.361,18
     Era preciso encontrar algo com o poder do ácido sem os seus efeitos colaterais letais para o corpo humano. “Alkahest e a pedra filosofal, combinados, formariam o remédio ideal: o primeiro suavizaria os efeitos negativos do ácido e a pedra era o complemento ideal, pois seria potente o bastante para dissolver até um metal resistente como o ouro e, ao mesmo tempo, inócuo contra o organismo”, explica Márcia. Não se pode, porém, negar que a busca desses produtos alquímicos também esteve ligada ao desejo de produzir ouro, almejado por plebeus e monarcas, e a muito “filosofismo” esotérico, em voga na Inglaterra puritana. “Encontramos muitos documentos nos arquivos da Royal Society que revelam uma visão milenarista de muitos sábios da época”, diz Ana.
       Menos vulgar do que o milenarismo medieval, os lentes britânicos preconizavam a “importação” de judeus dos Países Baixos para a Inglaterra, promovendo o encontro deles com os puritanos, uma mistura que criaria um “caldo natural” de onde nasceria o messias capaz de iniciar uma nova era de progresso científico, educacional e médico, onde todos poderiam se beneficiar dos avanços feitos nos laboratórios. “Eles queriam tornar tudo o que era incompreensível, logo ameaçador, em compreensível, via puritanismo, gerando o melhor e mais racional dos mundos”, conta Ana. Longe de delírio, era um debate que envolveu intensa troca de cartas entre membros da Royal Society e figuras como Espinoza e Leibniz. Einstein, que não jogava dados com o universo, tinha lá sua razão.
            Ao lado das pesquisas híbridas com a alquimia, todos eram segredos guardados a sete chaves. “Muitas vezes, havia casos de suborno, espionagem e roubo de ‘receitas’ alquímicas a mando de Oldenburg, em nome do progresso científico”, conta a pesquisadora. Essas receitas, porém, levantavam questões que ajudaram na criação da nova ciência. Afinal, os papéis secretos tinham ingredientes exóticos ou não os descreviam com precisão. Assim, como obter o material certo, puro o suficiente, capaz de fazer o receituário funcionar? Talvez, o malogro de se conseguir a pedra filosofal, por exemplo, se devesse a essas imprecisões. “Era a busca da transmutação, mas dentro de procedimentos que seriam a pedra fundamental da ciência moderna. O laboratório se transforma no lugar da ‘prova’. Antes usado para criar produtos, agora, entre os séculos XVII e XVIII, ele passa a servir como centro de padronização de experimentos”, observa Ana.
           A partir de questões alquímicas, iniciou-se a discussão sobre a necessidade de uma ciência universal, em cujo centro estava a preocupação com a capacidade de reproduzir um dado experimento, em se estabelecerem parâmetros científicos, um meio do caminho entre aspectos místicos e ciência. “O desenvolvimento gradativo da imprensa, que permitiu a maior circulação de informações, e as trocas entre os que haviam, tradicionalmente, guardado informações sigilosas, extraídas da antiga literatura e portadoras de seus vestígios, foi um fator de peso para o nascimento da nova ciência química”, analisa Ana. “Em troca das buscas obsessivas por materiais lendários, o laboratório acabou garantindo marcadores excelentes para os progressos de análise e síntese. Acima de tudo, pensava-se garantir através deles uma expressão material e visível para o estudo dos princípios ou bases elementares que, de outra forma, pareciam inatingíveis”, completa Márcia. Foram necessários mais de dois séculos para que o velho laboratório do alquimista se transformasse no do químico, com seus padrões modernos. Tempos em que a ciência tentava não mancar e parte da religião queria enxergar.
Artigos Científicos
1. ALFONSO-GOLDFARB, A. M.
 et al. Gur, Ghur, Guhr or Bur? The quest for a metalliferous prime matter in early modern times. British Journal for the History of Science. v. 44, p. 1-15, 2021.
2. ALFONSO-GOLDFARB, A. M.
 et al. Chemical Remedies in the 18th Century: Mercury and Alkahest. Circumscribere. v. 7, p. 19-30, 2020.
3. ALFONSO-GOLDFARB, A. M.
 et al. Lost Royal Society documents on ‘alkahest’ (universal solvent) rediscovered. Notes and Records of the Royal Society of London. p. 1-23, 2020.

Dom Casmurro, de Machado de Assis - Resumo do livro.

           Dear  Students:
           Como é muito difícil pesquisar todos os assuntos necessários,  nas minhas horas de folga pretendo postar algumas coisas interessantes:
             O resumo a seguir não se pode dizer "nossa que maravilha", mas nos dá uma boa ideia geral.  Perdoem minha falha na identificação e autoria do resumo a seguir, bem como a falta do link, mas não suprimi o nome dos autores e não deixei de identificá-los.   Boa leitura 
 Olha, pessoal, o resumo e a análise de Dom Casmurro postados neste blog não dispensam a leitura do livro, apenas reforçam o raciocínio sobre ele, sobre o autor e sobre o período literário. Não deixe de ler esse livro que, além de envolvente, é inteligente e gostoso de ler. Dê, a si mesmo, essa oportunidade, pois se trata de uma das nossas melhores obras. 
Machado de Assis
Dom Casmurro
 Análise desenvolvida por: Adriana Aparecida Thiago /
Carla Tisbe Gabriela Calegari / Denise Silmara Lino /
Juliana Berlucci / Juliana Marzola /

Liliane Marson Rossi do 3º ano de Letras das
Faculdades Integradas de Jaú
[adaptada]
ÍNDICE
SÍNTESE
RESUMO
NARRADOR E FOCO NARRATIVO

A LINGUAGEM
O ESPAÇO
AS PERSONAGENS
ANÁLISE CRÍTICA
Síntese
O narrador-personagem tenta restaurar, na velhice, a adolescência e, desta forma, viver o já havia vivido, e assim, conta a história:
Em meados de novembro de 1857, antes de perceber-se apaixonado pela vizinha Capitu, ao escutar a conversa entre José Dias e sua mãe sobre tornar-se seminarista, Bentinho, acorda sentimentos que ainda lhe eram despercebidos ao descobrir o amor que sentia pela moça e ao percebê-lo correspondido.
Começa, então, elaborar planos que impeçam sua ida ao seminário. Mas nem com planos mirabolantes Bentinho conseguiu evitar sua partida, seguindo, então, para os estudos eclesiásticos. Lá conheceu aquele que se tornou o seu melhor amigo, Escobar.
Depois de um tempo, convenceu sua mãe a custear os estudos de outro menino, e fazer dele padre em seu lugar padre em seu lugar. Formou-se em Direito voltou para casar-se com Capitu.
Escobar também saiu do seminário, casou-se com Sancha, amiga de Capitu e engajou-se no ramo do comércio. Escobar Sancha tiveram uma filha. A amizade de ambos os casais foi aumentando.
Bentinho e Capitu, depois de um tempo de espera, conseguiram ter também um filho que veio a chamar-se Ezequiel, em homenagem a Escobar.
O tempo foi passando. Escobar morreu afogado e Bentinho percebeu que Capitu havia ficado muito abalada com a morte de Escobar, mais abalada que o normal.
Bentinho passou, então, a desconfiar que houvesse certa semelhança na aparência de entre Escobar e seu filho.
Ezequiel foi internato em uma escola, mas, nos finais de semana, retornava a casa, deixando Bentinho atordoado com a traição estampada no rosto de seu próprio filho. Decide, com isso, levar a família à Europa onde Ezequiel e Capitu ficaram morando.
Dom Casmurro só voltou a ver Ezequiel quando este retorna da Europa anunciando a morte da mãe. Ao ver Ezequiel, Bento vê a imagem perfeita de Escobar. Passados alguns meses, Ezequiel viaja para o Oriente Médio e lá morre de febre tifóide.
O adultério paira nesse romance como uma incógnita, já que é apresentada uma série de provas e contraprovas sobre a traição de Capitu.
Resumo
Primeiramente, explica-se o nome do livro e o porquê da alcunha a Bento Santiago de “Dom Casmurro”:
a) “Casmurro” faz referência a seus reclusos e calados;
b) “Dom” é o termo irônico que lhe fornece ares de fidalgo.
O narrador-personagem, depois de tentar, sem sucesso, reconstituir a sua história através de uma cópia de sua casa na infância, decide atar duas pontas da sua vida, através de um livro autobiográfico que o ajudasse a restaurar o passado.
Dom Casmurro ou Bentinho, como era chamado o personagem na sua infância, morava em uma casa com sua mãe a viúva D. Glória, tio Cosme, prima Justina e, também, José Dias, agregado da família, que já era considerado como membro desta.
Era novembro de 1857, Bentinho escutou José Dias conversando com sua mãe, aconselhando D. Glória a colocar Bentinho no seminário o mais rápido possível, a fim de cumprir uma promessa feita no passado, pois já havia a desconfiança de que Bentinho estivesse apaixonando-se por uma vizinha, amiga de infância, Capitu.
Após escutar a conversa Bentinho, percebe que realmente gosta de Capitu. Ao declarar-se a vizinha, Bento percebe que seu sentimento é correspondido e passa a fazer planos para não precisar ir para o seminário. Mas Bentinho não tem êxito com seus planos e não consegue escapar do destino imposto pela religiosidade da mãe. Segue, então ao seminário, e lá conhece Escobar que veio a ser, mais tarde, o seu melhor amigo.
Bentinho se empenhou em convencer a mãe a custear os estudos de outra pessoa, fazendo dele padre em seu lugar. Dessa forma, o protagonista abandonou o seminário e foi para a faculdade de Direito. Formou-se advogado e retornou ao local da sua infância para casar com Capitu. O amigo Escobar também saiu do seminário e se casou com a melhor amiga de Capitu, Sancha.
Os dois casais vão fortalecendo as amizades. Sancha e Escobar têm uma filha que recebe o nome de Capitolina em homenagem a amiga Capitu.  Depois de um longo tempo de espera, Bentinho e Capitu, também têm um filho, quem recebe o nome de Ezequiel, como também se chamava Escobar.
O tempo foi passando e a vida transcorrendo muito bem entre os casais. Mas, um dia, Escobar morre afogado. No enterro do amigo, Bentinho percebeu em Capitu, uma tristeza enorme que lhe pareceu indevida. A esposa não só lhe parecia triste demais, mais do que o normal, como também lhe aparentava, dissimular tal tristeza.
No dia seguinte ao da morte do amigo, Bentinho, ao olhar para uma fotografia do falecido, notou certa semelhança entre ele e seu filho. Desde então surgem fatos, situações e lembranças que o conduzem ao adultério da esposa. Teria, Capitu, enganado Dom Casmurro?  Será que a esposa o havia traído com o seu melhor amigo?
O sentimento de traição passou a predominar e era horrível. Dom Casmurro chegou a procurar o suicídio, mas Ezequiel fez com que percebesse que, além do sentimento atormentador da traição e da condição de bastardo do filho, havia também o sentimento amoroso entre pai e filho.
“Quando nem mãe nem filho estavam comigo o meu desespero era grande, e eu jurava matá-los a ambos, ora de golpe, ora devagar, para dividir pelo tempo da morte todos os minutos da vida embaçada e agoniada. Quando, porém, tornava a casa e via no alto da escada a criaturinha que me queria e esperava, ficava desarmado e diferia o castigo de um dia para outro.” (Capítulo cxxxii)
Ezequiel foi colocado em um internato, mas à medida que o tempo foi passando sua semelhança com o falecido foi aumentando e nos finais de semana era impossível para Bentinho sentir-se em paz.
Bentinho não conseguiu expor claramente suas idéias para Capitu, não houve uma conversa muito clara entre o casal e Capitu por sua vez disse que a semelhança do menino com Escobar era casualidade do destino, mas mesmo assim decidiram partir para uma separação amigável, mantendo as aparências.
Bento resolveu então levar a família à Europa, e, de lá, voltou sozinho. Embora tenha viajado outras vezes para a Europa, nunca mais voltou a ver Capitu.
O tempo foi passando e morreram Tio Cosme, D. Glória e José Dias. Certo dia, Ezequiel voltou da Europa anunciando a morte também de Capitu. Dom Casmurro vê no filho a imagem perfeita de Escobar. Passados alguns meses Ezequiel viaja para o Oriente Médio e, depois de um tempo, morre de febre tifóide.
O narrador-personagem apresenta uma série de provas, e também contraprovas como o fato de Capitu ser tão parecida com a mãe de Sancha sem haver parentesco algum entre elas. Nenhuma das provas do adultério de Capitu encontradas por D. Casmurro foram comprovadas.
Mortos todos, familiares e velhos conhecidos, D. Casmurro, em sua vida fechada, ainda podia se consolar com algumas amigas, mas jamais se esqueceu do grande amor que o havia traído com seu maior amigo. Será que o havia traído?
A narrativa de seu livro se mostra eficaz ao tentar atar duas pontas de sua vida: a adolescência com a velhice e após o término, para esquecer o relembrado, o revivido, nada melhor que escrever outro livro: Uma História dos subúrbios do Rio de Janeiro.
Narrador e foco narrativo
A história é narrada na 1ª pessoa do singular, por um narrador-personagem, que se coloca como o escritor.
Para tentarmos nos aproximar de seu enigma, a história de Dom Casmurro apresenta como primeira chave, a própria figura deste que ao mesmo tempo a vive e a relata.
Trata-se de um velho solitário apelidado de Dom Casmurro. O autor da alcunha, foi um rapaz que, em uma viagem de trem, se aborreceu com a monotonia de Bento, cansado com o relato tão monótono da sua história de vida.
Outro ponto a se ressaltar no romance é o fato de seu narrador não ser confiável. Ele mente, distorce, confunde o leitor, com quem conversa ao longo da narração, anunciando a metalinguagem da literatura do século XX.
Machado de Assis adota um narrador unilateral, fazendo dele o eixo da forma literária. Inscrevia-se, então, entre os romancistas inovadores, além de convergir com os espíritos adiantados da Europa, que sabiam que toda representação comporta um elemento de vontade ou interesse, o dado oculto a examinar, o indício da crise da civilização burguesa.
Em Dom Casmurro, a dramatização do ato de narrar é um dos componentes essenciais do enredo e da vida do protagonista. Tal dramatização consiste no seguinte: em vez de simplesmente escrever uma história, Machado de Assis inventou uma personagem (um pseudo-autor) de quem nos é dado ver o ato de escrever o seu próprio romance.
Dom Casmurro também pode ser entendido como uma auto-análise de Bento Santiago, sobrevivente único de uma história de amor com final amargo: pois Bento julga-se traído pela esposa Capitu e pelo melhor amigo Escobar. Há vários anos após a morte da esposa e de seu suposto amante, Bento decide escrever o livro para restaurar no presente o equilíbrio perdido no passado.
O ponto de vista de Bento Santiago domina tudo na narrativa. Até mesmo as demais personagens não passam de projeções de sua alma. São lembranças do seu passado, que vão ressurgindo do subsolo da memória à medida que ele procura a reconstrução de si mesmo.
Linguagem
Machado de Assis utiliza alguns aspectos centrais na linguagem de Dom Casmurro: reflexões metalingüísticas, as ironias às expectativas do leitor, as digressões. Através delas, o narrador nos revela, como se os estivesse escondendo, não só os “bastidores” sombrios da personalidade de Bentinho, mas também a própria arquitetura do romance.
Por Exemplo, no capítulo 59 encontramos o seguinte trecho:
“Nada se emenda bem nos livros confuso, mas tudo se pode meter nos livros omissos (...). É que tudo se acha fora de um livro falho, leitor amigo. Assim preencho as lacunas alheias; assim podes também preencher as minhas.”
Esse fluxo é trabalhado literariamente ao longo do romance. Portanto na linguagem de Dom Casmurro há reflexão metalingüística — sempre recoberta pela ironia de seu ritmo, de sua não linearidade, da presença de “reticências”.
O espaço
Em Dom Casmurro, Bentinho, o protagonista morou toda a sua infância na rua de Matacavalos, em companhia de sua grande amiga e vizinha.
Bentinho só sai de lá, para entrar para o seminário em cumprimento de uma promessa que a mãe fizera e que não poderia ser quebrada. Em sua terra natal, o jovem deixa a mãe, o tio e seu grande amor, a vizinha.
Ao voltar, casa-se com Capitu, sua melhor amiga e também seu grande amor. Vão morar nos altos da Tijuca, na Praia da Glória, mas fazem visitas freqüentes a Matacavalos, onde agora moram o pai de Capitu, a mãe de Bentinho, assim como parentes e amigos.
Cada uma dessas regiões é explorada em seu texto, bem como as pessoas com quem Bentinho conviveu e que interagem no enredo. O livro é narrado, com emoção e riquezas de detalhes.
Personagens
Bento Santiago:
Quando jovem era um pouco mais baixo que Capitu. Não apresentava traços físicos definidos e revela-se como um moço rico, mimado pela mãe e, talvez por isso, não apresentasse o mesmo espírito vivaz e a iniciativa de Capitu. Comenta-se que, aproximadamente aos vinte e dois anos de idade, Bentinho se parecia muito com o pai:
“[...] sim tem alguma coisa, os olhos, a disposição do rosto. É o pai um pouco mais moderno, concluiu por chalaça.”
No passado dividia-se entre a mãe e a vizinha. Conforme escreve, o livro divide-se entre o passado e o presente. Tanto acusa quanto louva a falecida esposa.
Bento não pretendia ser padre como determinava sua mãe, sua intenção era casar-se com Capitu, sua amiga de infância. Depois de velho e da perda de seus familiares passa a viver isolado.
Ele mesmo diz:
“Uso louça velha e mobília velha “
“Em verdade, pouco apareço e menos falo. Distrações raras. O mais do tempo é gasto em hortar, jardinar e ler; como bem e não durmo mal”.
Capitolina: no inicio na narrativa, está com 14 anos e é um pouquinho mais alta do que Bentinho. Tem os cabelos grossos negros e compridos até a cintura. Seus olhos são negros e misteriosos a ponto de despertar no narrador a comparação com a ressaca do mar, é esperta, inteligente, extrovertida, criativa e previdente.
É ela que pensa primeiro num plano para livrar Bentinho do seminário e que desperta nele o impulso do primeiro beijo e que, após sua entrada no seminário, fica o maior tempo possível ao lado de D. Gloria. Torna-se querida de tal forma, que, quando José Dias usa a palavra nora D. Gloria sorri como quem aceita.
O narrador mostra, nas entrelinhas, a parca condição financeira da jovem Capitu:
“apertada em um vestido de chita, meio desbotado. [...] As mãos, a despeito de alguns ofícios rudes, eram curadas com amor [...] Calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos”.
Escobar:
Conhece Bento no seminário e logo se tornam amigos inseparáveis. Tem grande facilidade com números, por isso, sonha em ser comerciante e, assim que abandona o seminário, dedica-se ao negócio de café. É o grande desencadeador da trama, pois Bento acredita que ele tornou-se amante de sua esposa, Capitu.
José Dias definiu Escobar como um rapaz polido de olhos claros e dulcíssimos. O narrador o descreve da seguinte forma:
“A cara rapada mostrava uma pele alva e lisa. A testa é que era um pouso baixa, vindo a risca do cabelo quase em cima da sobrancelha esquerda — mas tinha sempre a altura necessária para não afrontar as outras feições, nem diminuir a graça delas. Realmente, era interessante de rosto, a boca fina e chocarreira, o nariz curvo e delgado. Tinha o sestro de sacudir o ombro direito, de quando em quando e veio a perdê-lo, desde que um de nós lhe notou um dia no seminário; primeiro exemplo que vi de que um homem pode corrigir-se muito bem dos defeitos miúdos”.
José Dias:
Era magro chupado, com um principio de calviçe e dedicado a família de Bentinho até a morte. Era agregado em casa de D. Gloria "apresenta-se como medico sem o ser.”
“[...] amava os superlativos. Era um modo de dar feição monumental às idéias; não as havendo, servia a prolongar as frases. [...] vi-o passar com as suas calças brancas engomadas, presilhas, rodaque e gravata de mola. Foi dos últimos que usaram presilhas no Rio de Janeiro, e talvez neste mundo. Trazia as calças curtas para que lhe ficassem bem esticadas. A gravata de cetim preto, com um arco de aço por dentro, imobilizava-lhe o pescoço; era então moda. O rodaque de chita, veste caseira e leve, parecia nele uma casaca de cerimônia. Era magro, chupado, com um princípio de calva; teria os seus cinqüenta e cinco anos. Levantou-se com o passo vagaroso do costume, não aquele vagar arrastado se era dos preguiçosos, mas um vagar calculado e deduzido, um silogismo completo, a premissa antes da conseqüência, a conseqüência antes da conclusão. Um dever amaríssimo!"
Dona Glória:
Mãe de Bentinho, senhora religiosa e viúva que, em razão de uma antiga promessa, desejava fazer do filho um padre.
“D. Maria da Glória Fernandes Santiago contava quarenta e dous anos de idade. Era ainda bonita e moça, mas teimava em esconder os saldos da juventude, por mais que a natureza quisesse preservá-la da ação do tempo. Vivia metida em um eterno vestido escuro, sem adornos, com um xale preto, dobrado em triângulo e abrochado ao peito por um camafeu. Os cabelos, em bandós, eram apanhados sobre a nuca por um velho pente de tartaruga; alguma vez trazia a touca branca de folhas. Lidava assim, com os seus sapatos de cordovão rasos e surdos, a um lado e outro, vendo e guiando os serviços todos da casa inteira, desde manhã até à noite.”
Tio Cosme:
Irmão de D. Glória, advogado e viúvo era modesto, gordo, olhos dorminhocos e respiração curta. Ocupa posição neutra: não se opunha aos planos de Bentinho, mas também não interrompia.
"Era gordo e pesado, tinha a respiração curta e os olhos dorminhocos. Uma das minhas recordações mais antigas era vê-lo montar todas as manhãs a besta que minha mãe lhe deu e que o levava ao escritório. O preto que a tinha ido buscar à cocheira segurava o freio, enquanto ele erguia o pé e pousava no estribo - a isto seguia-se um minuto de descanso ou reflexão. Depois, dava um impulso, o primeiro, o corpo ameaçava subir, mas não subia; segundo impulso, igual efeito. Enfim, após alguns instantes largos, tio Cosme enfeixava todas as forças físicas e morais, dava o último surto da terra, e desta vez caía em cima do selim. Raramente a besta deixava de mostrar por um gesto que acabava de receber o mundo. Tio Cosme acomodava as carnes, e a besta partia a trote."
Prima Justina:
Viúva prima de D. Glória. Parece ser egoísta, ciumenta e intrigante.
“Era quadragenária, magra e pálida, boca fina e olhos curiosos. Vivia conosco por favor de minha mãe, e também por interesse; minha mãe queria ter uma senhora íntima ao pé de si, e antes parenta que estranha.”
Pedro de Albuquerque Santiago:
Pai falecido de Bentinho.
“Não me lembra nada dele, a não ser vagamente que era alto e usava cabeleira grande; o retrato mostra uns olhos redondos, que me acompanham para todos os lados, efeito da pintura que me assombrava em pequeno. O pescoço sai de uma gravata preta de muitas voltas, a cara é toda rapada, salvo um trechozinho pegado às orelhas. [...] O que se lê na cara de ambos [os pais de Bentinho] é que, se a felicidade conjugal pode ser comparada à sorte grande, eles a tiraram no bilhete comprado de sociedade.”
Padre Cabral:
Velho amigo do tio Cose com quem costumava jogar durante as noites, na casa de D. Glória, e quem ensinou a Bentinho as primeiras letras, latim e doutrina. O padre ajuda Bentinho no caso do seminário, explicando para a família pode-se ter a vocação religiosa manifesta de outra forma que não a de se tornar padre:
“Prima Justina interveio: — Como? Então pode-se entrar para o seminário e não sair padre? — Padre Cabral respondeu que sim, que se podia, e, voltando-se para mim [Bentinho], falou da minha vocação, que era manifesta; os meus brinquedos foram sempre de igreja, e eu adorava os ofícios divinos. A prova não provava; todas as crianças do meu tempo eram devotas. Cabral acrescentou que o reitor de S. José, a quem contara ultimamente a promessa de minha mãe, tinha o meu nascimento por milagre; ele era da mesma opinião.”
Sancha:
Companheira de colégio de Capitu, filha de Gurgel, comerciante de objetos americanos que “era viúvo e morria pela filha”.  Sancha casa-se com Escobar.
“Escobar e a mulher viviam felizes, tinham uma filhinha. Em tempo ouvi falar de uma aventura do marido, negócio de teatro, não sei que atriz ou bailarina, mas se foi certo, não deu escândalo. Sancha era modesta, o marido trabalhador.”
O casal estreita amizade com Bentinho e Capitu:
“Demais, as nossas relações de família estavam previamente feitas; Sancha e Capitu continuavam depois de casadas a amizade da escola, Escobar e eu a do seminário. Eles moravam em Andaraí, aonde que riam que fôssemos muitas vezes, e, não podendo ser tantas como desejávamos, íamos lá jantar alguns domingos, ou eles vinham fazê-lo conosco. Jantar é pouco, íamos sempre muito cedo, logo depois do almoço, para gozarmos o dia compridamente, e só nos separávamos às nove, dez e onze horas, quando não podia ser mais.”
Ezequiel:
Filho de Capitu e Bentinho, cujas feições e trejeitos semelhantes aos de Escobar levam o narrador a desconfiar de que sua esposa o traíra, e a crer que não é seu filho, mas sim, de seu melhor amigo.
“Nem só os olhos, mas as restantes feições, a cara, o corpo, a pessoa inteira, iam-se apurando com o tempo. Eram como um debuxo primitivo que o artista vai enchendo e colorindo aos poucos, e a figura entra a ver, sorrir, palpitar, falar quase, até que a família pêndula o quadro na parede, em memória do que foi e já não pode ser. Aqui podia ser e era.”
ANÁLISE CRÍTICA
A obra
- É um conto sem cunho educativo.
- Remete o leitor a algumas passagens de “Otelo”, a obra de Shakespeare, e também aos Deuses Gregos.
- envolve temas atuais: um triângulo amoroso; a resistência do jovem a ser seminarista; a separação; a preocupação com as aparências etc.
- envolve temas atemporais: a dúvida da traição, e o sentimento de impotência perante a dúvida, o amor contrapondo-se ao ódio; o pensar na morte e no valor da vida; a solidão; a velhice, a necessidade de reparação etc.
- aborda características psicológicas do ser humano já que Bentinho foi criado sem o pai, fato que, em parte, define o comportamento do protagonista demonstrado na relação materna e matrimonial, bem como, na amizade com Escobar. Segundo o psicanalista Sigmund Freud, a relação afetiva com os pais é de grande importância para o comportamento do adulto, podendo ocasionar patologias futuras, como a neurose, muitas vezes reconhecida como o complexo de Édipo.
Os críticos
O crítico José Guilherme Merquior define o estilo narrativo de Dom Casmurro como uma obra de capítulos curtos (mini-capítulos), cujos títulos expressam o sarcasmo do autor, acomapnhando o estilo apresentado nos dois romances precedentes.
José Guilherme diz que Machado de Assis não apresenta as personagens, mas sim, denúncias. Para Guilherme, a arte de Machado é sugestionada ao máximo, carregada de humor expresso nas citações literárias, alusões mitológicas, linguagem figurada e expressões sentenciosas.
Já Barreto Filho diz que Machado de Assis vai à busca do trágico e sua visão em si se detém nas aparências das coisas. Sua arte tem a expressão — sentimento + razão — que é o ideal de Machado.
Dom Casmurro é uma contribuição brasileiríssima ao motivo básico da arte impressionista: a expressão elegíaca do tempo.
Antônio Cândido ressalta que os críticos que estudaram Machado nunca deixaram de inventariar sobre as causas do seu tormento social e pessoal, por isso, analisando o aspecto da vida intelectual, percebe-se que Machado sempre foi apoiado e aos cinqüenta anos já era considerado o maior escritor do país.


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